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Todo Mundo Tem Que Ser Incompetente?

Casar com a filha do dono da empresa, arrumar emprego público, ter padrinho político ou obedecer piamente às ordens do chefe eram, em linhas gerais, os caminhos para o sucesso no Brasil.

QI no Brasil é sinônimo de “quem indica”.

Ter um MBA no exterior, falar cinco idiomas, desenvolver nova tecnologia, caminhos certos para o sucesso no Primeiro Mundo, em nada adiantavam no Brasil.

Fui um dos primeiros brasileiros a me formar pela Harvard Business School, achando que eu seria cortejado para ser professor titular da FGV, eleito para uma diretoria do Conselho Regional de Administração, cortejado pelo Ministério da Educação, convidado para assessor do Presidente da FIESP, ter dezenas de head hunters querendo a minha cabeça.

Nada disto aconteceu.

Competência no Brasil é justamente uma ameaça ao status quo dos medíocres.

E são os medíocres que infelizmente dominam o país.

Sua missão será mudar esta visão de mundo.

Visão de mundo inclusive incentivada pela classe de intelectuais e os formadores de opinião, na maioria tão medíocres quanto.

Muitas empresas brasileiras ainda preferem mamar nas tetas do governo, do BNDES, com créditos subsidiados, numa economia protegida por acadêmicos no poder, do que gerar competência própria.

Até um perfeito imbecil toca uma empresa brasileira naquelas condições.

Fato que irrita sobremaneira a esquerda e os nossos intelectuais marxistas, com toda razão.

Contratar pessoas competentes, além de não ser necessário, era desperdício de dinheiro.

Competência num ambiente desses não tem razão para ser valorizada.

Até hoje no Brasil, os jovens não veem necessidade de adquirir conhecimentos. Acham que o objetivo é  passar de ano.

Felizmente, tudo isso já está mudando.

Empresários incompetentes estão quebrando ou vendendo o que sobrou de suas empresas para as multinacionais.

Por muitos anos, no Brasil, quem tivesse um olho era rei.

Daqui para a frente, serão necessários dois olhos, e bem abertos.

Sai o improvisador e o esperto, entra o Administrador formado em cooperação e treinamento.

A Função Social do Administrador é promover e treinar a competência. É identificar aqueles que têm talento e supervisioná-los. É medir os resultados dos velhos incompetentes e sugerir que se retirem de cena.

A regra básica daqui para a frente é a competência, e não a filiação política, a amizade ou o parentesco.

Competência profissional, experiência prática e não teórica, habilidades de todos os tipos.

De agora em diante, seu sucesso será garantido não por quem o conhece, mas por quem confia em você.

Estamos entrando numa nova era no Brasil, a era da meritocracia.

Felizmente, para os jovens que querem subir na vida, o mérito será remunerado e não desprezado.

Já se foi a época em que o melhor aluno da classe era ridicularizado e chamado de CDF, o Cu de Ferro, nome que dávamos para quem estudava e sabia a matéria, em vez de fazer política estudantil.

Se seu filho de classe média não está levando o 1º e o 2º grau a sério, ele será rudemente surpreendido pelos filhos de classes mais pobres, que estão estudando como nunca.

As classes de baixa renda foram as primeiras a perceber que a era do status quo acabou.

Hoje, até filho de rico precisa estudar, e muito.

Há vinte anos eram poucas as empresas brasileiras que tinham programas de recrutamento nas faculdades.

As empresas administradas por administradores colocam esta meta em primeiro lugar.

Hoje, as empresas possuem ativos programas de recrutamento nas faculdades não somente aqui, mas também no exterior.

Os 200 brasileiros que estão atualmente cursando mestrado em administração no exterior estão sendo disputados a peso de ouro.

Infelizmente, os milhares de jovens competentes de gerações passadas acabaram não desenvolvendo e tiveram seu talento tolhido pelas circunstâncias.

Talvez eles não tenham mais pique para desfrutar essa nova era, e na minha opinião esta é a razão da profunda insatisfação atual da velha classe média.

Mas os jovens de hoje, especialmente aqueles que desenvolveram um talento, os estudiosos e competentes, poderão finalmente dormir tranquilos.

Não terão mais de se casar com a filha do dono, arrumar um padrinho, aceitar desaforo de um patrão imbecil.

O talento voltou a ser valorizado e remunerado no Brasil como o é mundo afora.

Talvez ainda mais assustador é reconhecer que o Brasil não será mais dividido entre ricos e pobres, mas sim entre competentes e incompetentes.

Os incompetentes que se cuidem.

( Publicado originalmente na Revista Veja edição 1536 ano 31 nº 9 de 4 de março de 1998)

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