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Renato Targa

A definição do que é fotografia digital é muito simples: um tipo de fotografia que usa tecnologia digital para registrar imagens, em contraposição à fotografia tradicional, baseada em um processo químico.

O princípio físico da câmera fotográfica foi desenvolvido na Idade Média e já estava pronto desde o Renascimento, quando era explorada pelos artistas. A forma de registrar as imagens era desenhando, pintando ou talhando por cima da imagem projetada em uma superfície. A fotografia, que é um registro técnico dessa imagem projetada, só existiu a partir do momento em que algum tipo de suporte que gravasse a imagem automaticamente fosse criado. A primeira solução viável, no século 19, foi a descoberta de materiais sensíveis à luz que deveriam ser expostos e depois submetidos a um processo químico de revelação. E essa invenção transformou o olhar da humanidade sobre o mundo e sobre ela mesma.

Atualmente, esse processo de revelação é que vem sendo substituído pelo processo digital de captura das imagens em seus mais diferentes usos. A indústria produziu vários tamanhos e formatos de filme para usos distintos, que representam diferentes resoluções. O mais popular e barato deles, o 35mm, é o que vem mais rapidamente cedendo espaço para a fotografia digital. Já é mais barato fotografar com uma câmera digital, mesmo ela sendo bem mais cara que a câmera tradicional, por eliminar os custos de material e revelação. Também já existem boas alternativas para os formatos médios, bastante populares na fotografia de estúdio e publicidade. Porém, em sistemas de câmeras para chapas de filme de grande formato, mais usadas em fotografia de natureza e arte, ainda são raras as opções digitais viáveis, por exemplo.

A fotografia sempre esteve relacionada a um registro de memória, para congelar um intervalo de tempo algo que pode ser visto (claro que há variações, em que a câmera grava um intervalo maior ou menor do que o olho normalmente registra, criando efeitos difíceis ou impossíveis de serem vistos).

Fotografar tornou-se um hábito na sociedade, mais forte em algumas culturas do que em outras, mas presente em quase todas.

Tanto pelo aspecto de preservação da memória, ou gatilho dela, pelas lembranças que a fotografia evoca, como objeto colecionável e que pode ser compartilhado. Quem nunca quis mostrar para alguém suas fotos? E também tornou-se uma forma de lazer bastante popular, assim como o turismo, que virou indústria importante na cultura contemporânea. Como diz Susan Sontag, em “Sobre a Fotografia” (“On Photography”, em inglês):

“Os turistas sentem-se compelidos a pôr a câmera entre sim mesmos e tudo de notável que encontram. Inseguros sobre suas reações, tiram uma foto. Isso dá forma à experiência: pare, tire uma foto e vá em frente. O método atrai especialmente pessoas submetidas a uma ética cruel de trabalho —alemães, japoneses e americanos. Usar uma câmera atenua a angústia que pessoas submetidas ao imperativo do trabalho sentem por não trabalhar enquanto estão de férias, ocasião em que deveriam divertir-se.”

Pessoalmente, fotografar é  um prazer, uma paixão. É uma forma de unir racionalidade e criatividade. Uma atividade em que eu ativo os dois lados do cérebro, para lidar com critérios técnicos e artísticos ao mesmo tempo. É a junção do olho com a mão, comandados pelo cérebro, trabalhando em sintonia para produzir uma imagem. Mais espontâneo quando comandado pelo olho, mais cerebral quando parte de um projeto, de uma série.

Usar uma câmera digital me permitiu duas coisas que alimentaram tanto o meu aprendizado como meu prazer em fotografar: o baixo custo por clique e o resultado instantâneo. Por ser conferido na hora, avaliando a imagem gerada e o histograma de luminosidade, eu consigo testar técnicas e efeitos imediatamente, refinando a exposição, para chegar mais próximo da imagem que eu tenho em mente ao fotografar. Antes da fotografia digital, muitos fotógrafos usavam câmeras de revelação instantânea, como a Polaroid, como rascunho do trabalho que iriam produzir, para testar se a luz estaria adequada, por exemplo.

Com a fotografia digital, dois fenômenos ocorrem: primeiro é o volume, tiramos muito mais fotos, guardamos mais fotos (e também perdemos mais fotos, com a falta de back-up e organização); segundo é a divulgação. Enviar fotos digitalmente para alguém, que são cópias idênticas e gratuitas dos arquivos, é muito simples, seja por e-mail, seja transferindo para um disco ótico, rígido ou pen drive, assim como é relativamente simples e normalmente gratuito publicá-las na web.

Com a edição digital das imagens, a famosa “photoshopada”, algumas questões éticas do uso da fotografia surgem em alguns círculos, como o jornalismo, em que a manipulação é mal vista. Antes a fotografia era confiável, o fotógrafo é que poderia mentir. Porém, com o avanço tecnológico, a geração de arquivos RAW como se fossem exposições de filme não reveladas, que precisam de algum tipo de pós-processamento, seja na própria câmera, seja no computador, levam a uma contradição: a tendência é assumir que a foto pode ser uma mentira, mas a reputação do fotógrafo é que vai dizer se ela é confiável ou não, um questionamento que já ocorre em toda a representação interpretativa da realidade: sejam textos, pinturas ou desenhos. E o vídeo, que é uma sequência de fotos exibidas em uma frequência estabelecida, também migra para o mundo digital e passa pelo mesmo processo.

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