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Fabiano Carnevale

A disponibilidade e massificação das ferramentas de mapeamento na internet constituem uma das faces mais interessantes e transformadoras da visualização de dados antes restritos ou sequer divulgados. O georreferenciamento de dados pela internet ajuda a subverter a lógica da cartografia oficial, tecnicamente complexa e de acesso direcionado a pesquisadores e interessados.

Quando jovens de comunidade de baixa renda no Rio mapeam logradouros não identificados nos mapas oficiais (http://wikimapa.org.br) ou ainda quando comunidades tradicionais da Amazônia formatam suas demandas em linguagem cartográfica (http://www.novacartografiasocial.com), estamos falando de possibilidades abertas para a construção de novas leituras da realidade.

Ainda que embrionariamente, o georreferenciamento de dados também têm se transformado em ferramentas relevantes nas campanhas eleitorais em todo o mundo. O software open source Ushahidi (http://www.ushahidi.com/), além de ser utilizado para mapear crises humanitárias, funciona como monitor de processos eleitorais complexos, como nas eleições do México e da Índia.

Mais do que ferramentas de monitoramento, o georreferenciamento traz luz para questões políticas pontuais, colocando foco numa determinada proposta eleitoral, num problema específico, no compartilhamento democrático de informações ou ainda construindo formatos de participação e mobilização da sociedade na gestão pública.

Durante a campanha de Fernando Gabeira à prefeitura do Rio em 2008, utilizamos de forma estratégica a elaboração de mapas, que se transformaram em peças fundamentais na comunicação com os eleitores.

Começamos com o mapa “O Rio como você vê” (aplicativo produzido e elaborado pela agência de criação OEstudio), que propunha uma construção coletiva na identificação dos problemas da cidade. Com isso, pretendíamos aprimorar a aplicação de políticas públicas e ainda potencializar o envolvimento da sociedade no processo de resolução dos problemas. A ideia era demonstrar a partir desta aplicação prática uma das propostas da campanha, que era a participação da sociedade na gestão pública através das novas tecnologias.

Entretando, foram os mapas produzidos com maior simplicidade, utilizando as ferramentas básicas do Google Maps é que alcançaram maior visibilidade e impacto. Uma das peças mais acessadas da campanha foram os mapementos da ocupação armada na cidade. Os mapas das Milícias e do Tráfico [que posteriormente sobrepostos constituíram o Mapa da Ocupação Armada no Rio (http://goo.gl/mrTHTb] trouxeram para o debate político daquela eleição a responsabilidade da prefeitura sob esse tema. Considerado como uma questão puramente estadual, a campanha conseguiu demonstrar que a segurança pública era uma temática que envolvia diretamente os candidatos a prefeito.

A questão básica era responder como ser prefeito de uma cidade onde não se pode andar livremente em todos os espaços. No decorrer da campanha, situações que colocaram em risco os próprios candidatos, como o impedimento da livre circulação em comunidades dominadas por organizações armadas, não só demonstraram a relevância dos mapeamentos, como trouxe à tona para a opinião pública que a problemática da segurança pública se articulava de forma contundente com a perspectiva municipal.

Outra utilização bem sucedida do georreferenciamento durante a campanha foi como contraponto a uma das principais críticas recebidas por Gabeira no início da campanha. Considerado pelo imaginário político da cidade um “candidato da Zona Sul” (região mais rica da cidade), utilizamos o mapeamento das principais propostas do programa de governo (destacadamente voltado às zonas menos abastadas) para, visualmente, responder essa questão de forma facilmente identificável para os eleitores.

Esses e outros exemplos demonstram que o georreferenciamento é uma das ferramentas mais eficazes na construção de uma campanha política. Além de servir como visualização de plataformas de governo, pode aprimorar a aplicação de políticas públicas, dar visibilidade a dados que costumam ser obscurecidos pela burocracia estatal e ainda envolver a sociedade no processo de resolução dos problemas.

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