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Bruno Scartozzoni

Muito tem se falado sobre storytelling, mas tão importante quanto entender o que é e como utilizar é compreender o motivo do atual interesse por algo que de novo não tem nada. Então, que tal começarmos pelo começo?

Storytelling, ou “contação de histórias”, pode ser entendido como uma tecnologia de comunicação humana, ou seja, uma série de técnicas e métodos utilizados para transmitir conhecimento de uma pessoa para outra. Contar histórias é algo que remete às origens da humanidade e esteve presente em nossas vidas desde as antigas mitologias até o moderno cinema, passando pela literatura, quadrinhos, teatro, novelas, seriados e muitos outros meios com os quais você deve estar mais ou menos acostumado.

Hoje em dia o conceito de storytelling é mais comumente ligado à ficção, mas também é possível contar histórias a partir de fatos reais. Aliás, fazemos isso de forma intuitiva todo o tempo. Contar histórias nada mais é do que ordenar fatos (fictícios ou não) de uma forma específica, por meio da qual o cérebro humano está naturalmente preparado para receber informações. Mas que forma é essa?

Independente de gênero e formato, seja um filme de comédia romântica, um livro de ficção científica ou alguém falando sobre a viagem da qual acabou de voltar, toda história possui alguns elementos em comum.

Em primeiro lugar, toda história tem pelo menos um protagonista, ou seja, o personagem através do qual iremos enxergar os fatos. Histórias são sempre sobre pessoas e seus sentimentos, e nunca sobre coisas (a menos que essa coisa tenha uma personalidade humana, como no caso do robô Wall-e). Histórias são sobre verdades humanas, aquelas que são intraduzíveis para um PowerPoint.

Em segundo lugar, histórias nunca são sobre situações rotineiras, e sim sobre o extraordinário. Se sua rotina é quebrada de algum jeito, então você tem uma história para contar.

Em terceiro lugar, toda história deve ter um conflito para ser o motor da história. O conflito é o desafio do protagonista, que acontece a partir da diferença entre sua expectativa e a realidade. Em outras palavras, histórias tratam de superação e transformação.

Um exemplo: rapaz se apaixona por moça, mas ela ama um terceiro. E agora? O que ele vai fazer para conquista-la? Antes disso, o que vai fazer para superar a timidez e o medo de rejeição? Independente dos resultados, esse personagem nunca mais será o mesmo depois de lidar com esses problemas. E aí está a mágica da coisa.

Por meio das histórias nós, o público, aprendemos mais sobre nós mesmos e sobre os desafios da vida. Quando entramos de cabeça em uma história (e neurologicamente é como se estivéssemos vivendo outra realidade mesmo) vamos captando informações preciosas para o nosso dia-a-dia. A partir de uma história como a do exemplo acima é possível aprender como lidar com o medo, a timidez e a frustração de não ser correspondido, além de aprender algumas técnicas para conquistar a pessoa desejada. Não nos damos conta desse processo, mas acontece a todo momento.

Nos últimos anos muitas empresas e profissionais de comunicação começaram a se interessar por storytelling, e isso coincidiu justamente com o período de maior popularização da internet no Brasil e no mundo. Garanto que não é obra do acaso. Com banda larga e computadores cada vez mais acessíveis assistimos a um aumento exponencial de informação e canais disponíveis no ecossistema midiático. Um estudo recente mostrou que em apenas 60 segundos são criados mais de 60 blogs, feitas cerca de 700 mil atualizações de status no Facebook, e acontece o upload de mais de 25horas de vídeo no YouTube.

É humanamente impossível consumir tudo isso, e o resultado da abundância de informação é a escassez de atenção. Com tantas opções a um simples clique, alguém com a intenção de comunicar algo enfrentará como concorrência não só mensagens semelhantes, mas também fotos de gatos, vídeos engraçados, eventos transmitidos online, e-mails da namorada etc. O tempo das pessoas é um só, e uma mensagem precisa ser mais interessante do que todo o resto disponível para chamar atenção. Aí que entra o storytelling.

Por mais que a oferta de histórias também tenha aumentado bastante, bons contadores de histórias nunca tiveram problema em capturar a atenção de seus públicos. Não conheço alguém que em qualquer momento da vida não esteja lendo um livro, acompanhando uma novela, frequentando o teatro ou consumindo histórias de alguma forma. Histórias são úteis para a nossa própria sobrevivência, e por isso talvez tão importantes quanto o oxigênio e nutrientes da comida.

Nesse cenário contar histórias é uma forma de agregar entretenimento, contexto e serviço à sua mensagem. Que o diga o personagem Wilson, do filme O Náufrago, que mesmo sem falar uma palavra emocionou milhões de pessoas, agregou novos significados à marca e ainda por cima ensinou aos espectadores alguma coisa sobre amizade e solidão. Uma propaganda tão boa que, mesmo tendo 2 horas de duração, as pessoas pagaram ingresso para assisti-la. Mas, do ponto de vista da marca, tudo bem se alguém quisesse piratear. Quanto mais a propaganda for assistida, melhor.

Contar uma boa história não é uma tarefa fácil, pois exige conhecimento da técnica e do próprio ser humano, além de espaço para uma expressão mais autêntica e autoral. No caso de histórias reais faz-se necessária uma curadoria especializada, a visão de alguém que reorganiza os fatos de acordo com a técnica. Grande parte das empresas não está preparada para isso, mas o consumidor desatento não levará isso em consideração.

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