A Ciência da Aprendizagem é um campo interdisciplinar que contribui para o avanço da nossa compreensão sobre a aprendizagem – como acontece, como pode ser facilitada, como é dificultada. Consiste na investigação desenvolvida em campos como a neurociência, a psicologia, a educação, ciência da computação e tecnologia educativa, e esforça-se por compreender e otimizar a aprendizagem (Sawyer, 2006; Meltzoff et al., 2009). A Ciência da Aprendizagem influencia disciplinas académicas tais como as humanidades, as ciências sociais, as ciências, as artes – e incentiva a utilização de abordagens de aprendizagem ativa. No seu núcleo, a Ciência da Aprendizagem baseia-se em teorias neurocientíficas da aprendizagem. Contudo, ainda existe muito conhecimento que é necessário compreender sobre o cérebro e sobre como a aprendizagem acontece. Adicionalmente, compreender as complexidades da aprendizagem a partir de uma perspetiva biológica é um desafio, mesmo para os cientistas. Por conseguinte, o conteúdo utilizado no projeto Illuminated é uma simplificação e uma generalização de conceitos, estudos e teorias selecionadas das neurociências. O projeto Illuminated é um projeto europeu financiado pelo Programa Erasmus+ que reúne especialistas em tecnologia da educação, desenvolvimento de professores e neurociência cognitiva para apoiar os professores na conceção de melhores práticas educativas, fazendo uso do conhecimento da neurociência. No âmbito deste projeto, foram criados dois workshops para professores centrados no tema “neurociência aplicada à conceção da aprendizagem”, que estão disponíveis como recursos educativos abertos em http://illuminatedproject.eu.

Avanços nas Neurociências

Existindo ainda muito a aprender sobre o funcionamento do cérebro, foram feitos progressos significativos na nossa compreensão do cérebro e da base biológica da aprendizagem. Um exemplo de quão longe chegámos na nossa compreensão da aprendizagem e da memória é o trabalho recente do MIT. Este é um título da investigação feita no laboratório do MIT por Susumu Tonegawa: Susumu Tonegawa pode fazer com que os ratos se lembrem de coisas que nunca aconteceram (Humphries, 2016). Em contexto de laboratório, esta equipa tem sido capaz de manipular as memórias dos ratos. O que é que eles foram capazes de fazer? Eles conseguiram observar uma forma de memória, rastreá-la e rotulá-la. Reativaram a memória de acordo com os seus propósitos e fizeram com que o rato executasse um comportamento. Manipularam a memória – criando uma memória falsa – e depois ativaram-na para criar um novo comportamento (Tonegawa et al., 2015).  Embora ainda haja um longo caminho a percorrer do laboratório à prática e dos ratos aos seres humanos, os mecanismos subjacentes à aprendizagem e à demonstração da aprendizagem através do comportamento estão a tornar-se muito mais claros. Já foi descoberto o suficiente sobre a forma como aprendemos, dando origem a várias publicações que destacam as descobertas mais relevantes para os educadores e sobre a forma como tais descobertas podem ser aplicadas para melhorar as práticas de ensino [ver referências: Science of Learning – Introduction to Evidence-based Practices].

Desenho de Aprendizagem

Adicionalmente à Ciência da Aprendizagem, os materiais produzidos pelo projeto Illuminated estão alinhados com o design de aprendizagem (Learning Design), que é uma abordagem que apoia os professores a tornarem-se designers de experiências de aprendizagem. O Design de Aprendizagem baseia-se frequentemente na tecnologia que facilita aos professores a documentação, implementação, reflexão e melhoria dos seus designs de aprendizagem ao longo do tempo (Dalziel, 2013; Mor, Craft & Hernández-Leo, 2013; Mor, Ferguson & Wasson, 2015). O design para a aprendizagem envolve a tomada de decisões tais como a seleção de tipos de tarefas de aprendizagem a utilizar, a calendarização de conteúdos entre aulas e no decurso da aula, e a determinação de formas ótimas de apresentar novas informações.

Ciência da Aprendizagem – Visão global de práticas pedagógicas baseadas em evidências

O objetivo do projeto Illuminated não é ensinar biologia ou neurociência, mas sim introduzir conceitos-chave da Ciência da Aprendizagem que possam ser aplicados funcionalmente às práticas de ensino e utilizados para informar as decisões de design de aprendizagem. Isto envolve a introdução de estratégias baseadas em evidências para apoiar tais decisões ou, por outras palavras, ajudar os professores a familiarizarem-se com estratégias que são consistentes com a Ciência da Aprendizagem e que são apoiadas por provas empíricas. Um segundo objetivo é, assim o esperamos, despertar o interesse dos educadores pela Ciência da Aprendizagem e pela forma como a aprendizagem acontece/e não acontece, pois é um campo fascinante de relevância direta para os professores. O conceito global do projeto Illuminated é “trazer à luz estratégias de ensino eficazes através da ciência da aprendizagem”. Tal como “o ensino é facilitado ou dificultado por diferentes estratégias de aprendizagem”, também “a aprendizagem é reforçada ou impedida por diferentes estratégias educativas” (Hascher, 2010). Esperamos que os materiais deste projeto possam fornecer conhecimentos adicionais para investigar as dificuldades dos estudantes e otimizar a sua aprendizagem. Adicionalmente, os workshops tentam providenciar aos educadores não apenas a possibilidade de aprender acerca de estratégias baseadas em evidências, mas também experimentá-las como os estudantes o fariam.

Conceito e necessidade do Illuminated

Qual é a relevância do projeto Illuminated? Apesar de um consenso crescente sobre os mecanismos cerebrais subjacentes à aprendizagem na comunidade científica, o mesmo provavelmente não pode ser dito sobre os educadores. Muitos educadores não aprenderam sobre os mecanismos subjacentes à aprendizagem (Pomerance, Greenberg & Walsh, 2016; Beardsley, Martínez-Moreno & Hernández-Leo, 2020). Como parte integrante do projeto Illuminated, realizámos um inquérito sobre a Ciência da Aprendizagem perguntando aos educadores sobre os conceitos básicos e terminologia (tal como a neuroplasticidade, neurónios, sinapses, etc.). O que podemos dizer sobre os resultados? Eles foram altamente variáveis. Os educadores inquiridos têm opiniões diferentes sobre os conceitos básicos subjacentes à aprendizagem e têm diferentes níveis de familiaridade com os termos fundamentais relacionados com a biologia da aprendizagem. Esta variabilidade nas crenças sobre a forma como os estudantes aprendem, torna desafiante ter uma base comum a partir da qual se pode construir uma base de conhecimento coletiva para os educadores. Além disso, muitas escolas estão a adotar métodos baseados em investigação – inquiry-based learning, no original (por exemplo, aprendizagem baseada na resolução de problemas, aprendizagem por descoberta, aprendizagem experiencial, aprendizagem construtivista, aprendizagem baseada em projetos), ou estão pelo menos a incorporá-los nas suas práticas. Uma síntese de 72 estudos empíricos demonstrou que a supervisão é fundamental para o sucesso da aprendizagem baseada em investigação (Clark, Kirschner, & Sweller, 2012; Lazonder & Harmsen, 2016), concluindo que estas abordagens, na ausência de supervisão, carecem de eficácia e conduzem a um desempenho inferior quando comparadas com os métodos tradicionais utilizados em sala de aula. É possível que os principais benefícios residam na forma como estas abordagens afetam a motivação e a emoção dos estudantes – ambas críticas para a aprendizagem. Mas é necessária supervisão para abordar os processos cognitivos relacionados com a aprendizagem – processos que estão relacionados com a forma como o nosso cérebro funciona e que são comuns a todos os alunos com níveis de desenvolvimento normal.

Referências

A Ciência da Aprendizagem
  • Meltzoff, A. N., Kuhl, P. K., Movellan, J., & Sejnowski, T. J. (2009). Foundations for a new science of learning. science, 325(5938), 284-288.
  • Sawyer, R. K. (Ed.). (2006). The Cambridge handbook of the learning sciences. Cambridge University Press.
Avanços nas Neurociências
  • Humphries, Courtney. (2016, Oct. 14). Susumu Tonegawa studies how memories are stored and how they can be manipulated. MIT Technology Review. Retrieved from https://www.technologyreview.com/s/602558/tracing-a-memory/
  • Tonegawa, S., Pignatelli, M., Roy, D. S., & Ryan, T. J. (2015). Memory engram storage and retrieval. Current opinion in neurobiology, 35, 101-109.
Desenho de Aprendizagem
  • Dalziel, J., Conole, G., Wills, S., Walker, S., Bennett, S., Dobozy, E., Cameron, L., Badilescu-Buga, E. and Bower, M.  (2013). The larnaca declaration on learning design–2013.
  • Mor, Y., Craft, B., & Hernandez-Leo, D. (2013). The Art and Science of Learning Design: Editorial. Research in Learning Technology, Vol. 21.
  • Mor, Y., Ferguson, R., & Wasson, B. (2015). Learning design, teacher inquiry into student learning and learning analytics: A call for action. British Journal of Educational Technology, 46(2), 221-229.
Ciência da Aprendizagem – Visão glocal de práticas pedagógicas baseadas em evidências
  • Hascher, T. (2010). Learning and Emotion: perspectives for theory and research. European Educational Research Journal, 9(1), 13-28.
  • Ericsson, A., & Pool, R. (2016). Peak: Secrets from the new science of expertise. Houghton Mifflin Harcourt.
  • Gooding, H. C., Mann, K., & Armstrong, E. (2017). Twelve tips for applying the science of learning to health professions education. Medical teacher, 39(1), 26-31.
  • Paas, F., Renkl, A., & Sweller, J. (2003). Cognitive load theory and instructional design: Recent developments. Educational psychologist, 38(1), 1-4.
  • Pashler, H., Bain, P. M., Bottge, B. A., Graesser, A., Koedinger, K., McDaniel, M., & Metcalfe, J. (2007). Organizing Instruction and Study to Improve Student Learning. IES Practice Guide. NCER 2007-2004. National Center for Education Research.
  • Schneider, M., & Stern, E. (2010). The cognitive perspective on learning: Ten cornerstone findings. The nature of learning: Using research to inspire practice, 69-90.
Conceito e necessidade do Illuminated
  • Pomerance, L., Greenberg, J., & Walsh, K. (2016). Learning about Learning: What Every New Teacher Needs to Know. National Council on Teacher Quality.
  • Beardsley, M., Martínez-Moreno, J. & Hernández-Leo, D. (2020). Comparing pre-service and in-service teacher perceptions of the science of learning. 11th International Conference on University Teaching and Innovation (CIDUI): Beyond competencies: new challenges in a digital society.
  • Clark, Richard E., Paul A. Kirschner, and John Sweller. “Putting Students on the Path to Learning: The Case for Fully Guided Instruction.” American Educator 36.1 (2012): 6-11.
  • Lazonder, A. W., & Harmsen, R. (2016). Meta-analysis of inquiry-based learning: Effects of guidance. Review of educational research, 86(3), 681-718.

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